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04/09/2018

A marca esportiva mais “descolada” do mundo

Coluna do treinador, Iuri Lage

Há algumas semanas divulguei aqui no blog a iniciativa de uma marca esportiva de se comprometer em utilizar somente materiais recicláveis para fabricação de seus produtos até o ano 2024.

No mesmo dia recebi mensagens de dois amigos que leram o texto, sugerindo que eu pesquisasse sobre a marca californiana de roupas e acessórios esportivos chamada Patagonia (sem acento mesmo).

Para quem (assim como eu) não conhecia, a Patagonia foi classificada como a empresa mais “descolada” do planeta pela revista americana Fortune, e sua missão é:  “Construir o melhor produto, sem causar danos desnecessários usando negócios para inspirar e implementar soluções para a crise ambiental.”

 

 

Sei que alguns especialistas de marketing apontam o “consumo sem culpa” como um grande nicho de mercado para os próximos anos e naturalmente uma sobrevida ao capitalismo que já demonstra não ter saída devido aos recursos finitos do planeta e o crescimento populacional.

Mas o que difere a Patagonia de outras marcas é sua longa história repleta de iniciativas que comprovam esse compromisso com a preservação do meio ambiente, muito antes da crise ambiental ser uma pauta urgente e consumo consciente ser moda.

 

A história

Tudo começou com o jovem americano Yvon Chouinard. Ele iniciou a prática do alpinismo em 1954, aos 14 anos de idade.

Aos poucos, em suas escaladas, ele percebeu que os pitões de ferro (ferramenta pregada na montanha para dar suporte à escalada),precisavam ser deixados na rocha, o que resultava em uma agressão à natureza. Foi então que, em 1957, após pesquisar sobre o assunto, ele resolveu produzir um pitão de aço temperado com cromo e molibdênio na garagem da casa de seus pais na cidade californiana de Burbank, que seria o ponto de partida para que desenvolvesse uma série de equipamentos “amigos do meio ambiente”.

Seus pitões fizeram tanto sucesso que ele começou a vender para outros alpinistas e aventureiros através de sua nova empresa, a Chouinard Equipment. Ele conseguia fabricar dois pistões por hora, que eram vendidos por US$ 1.50 cada.

Em 1965 ele mudou seu negócio para a cidade de Ventura, também na Califórnia, fazendo uma parceria com seu amigo Tom Frost, um engenheiro aeronáutico, para automatizar sua produção e poder assim atender a alta demanda.

No início dos anos de 1970, a empresa já era a maior produtora de equipamentos para alpinismo do mercado americano. Já um empresa diferenciada por sua enorme preocupação: a sustentabilidade.

Um exemplo disso aconteceu quando ao perceber que seus equipamentos de escaladas continuavam destruindo as rochas das montanhas, decidiu cancelar a venda do produto, mesmo sabendo que essa linha representava 70% de suas vendas.

Felizmente eles tinham outra alternativa: os pitão de alumínio, reutilizável, uma grande novidade para a época. Mas as margens de lucros eram insuficientes para sustentar a empresa e, foi então, que eles começaram a vender roupas para os alpinistas, importadas do Reino Unido.

Como a aceitação foi excelente, os rumos da empresa estariam prestes a mudar.

As roupas e acessórios, extremamente duráveis, entre os quais calças tipo capri; shorts com reforço traseiro, feitos de veludo ultra resistente, produzido em uma tecelagem em Lancashire, na Inglaterra; suéteres tipo Chamonix; camisas de marinheiro mediterrâneas clássicas; calças e camisas de lona; além de luvas e até sacos para dormir, faziam cada vez mais sucesso.

Era preciso encontrar um nome para sua linha de roupas. Inspirado em sua viagem incrível em 1968 onde Yvo saiu da Califórnia e chegou até o sul da Argentina veio o nome Patagonia.

Feitos importantes

 Em 1996,  a empresa decidiu arriscar 25% de suas vendas anuais, ao trocar toda sua linha de vestuário de algodão normal para algodão orgânico, ao perceber que o uso de pesticidas nas plantações poluía rios e causava doenças aos trabalhadores nas linhas de produção. O algodão orgânico naquela época era três vezes mais caro que o tradicional.

– Alguns anos depois, a Patagonia desenvolveria uma nova tecnologia que permitiu a fabricação do revestimento das jaquetas a partir de garrafas descartáveis.A partir daí Yvon passou então a reestruturar o negócio, priorizando o uso de materiais naturais e recicláveis em todas as peças.

– A Patagonia também desenvolveu um novo traje de surfe quente, flexível e ambientalmente correto, feito de fibras naturais que se tornou uma opção sustentável em relação ao tradcional neoprene.

– Em 2011, durante a popular Black Friday, a famosa sexta-feira em que os americanos vão às compras de forma compulsiva, a Patagonia publicou um anúncio de página inteira no tradicional jornal The New York Times dizendo: “Não compre esta jaqueta”. Detalhe: a jaqueta era da própria marca. Mais abaixo, os avisos: REDUZA. Nós fazemos produtos que duram muito tempo, assim, não compre aquilo que não precisa.

 

 

– A Patagonia oferece serviço de restauração dos seus próprios produtos por um preço acessível para que não seja preciso comprar um novo (!) .

– Através do programa chamado Common Threads Initiative, A empresa montou uma estrutura para receber de volta roupas velhas e gastas da marca, que são enviadas para recicladores, em muitos casos, em outros países.  Aproximadamente 47 toneladas de roupas foram devolvidas à empresa desde então – e a sua reciclagem deu origem a mais de 35 toneladas de vestimentas novas.

– Mais recentemente a empresa lançou uma campanha cujo conceito central era a proposta “Celebrate the stuff you already own”, algo como “Celebre as coisas que você já tem”. A campanha, que foi criada como antídoto para conceitos de promoção comercial, consiste em histórias de pessoas contadas a partir de peças de roupa da marca que as acompanham à muito tempo, ilustradas com fotos que traduzem o mesmo conceito como, por exemplo, uma jaqueta infantil que tem em sua etiqueta os sete nomes das crianças a quem ela já pertenceu. Desse modo, essas histórias transmitem, com base em fatos reais, toda a durabilidade da marca Patagonia.

– Desde 1985, a Patagonia destina 1% de sua receita ou 10% do lucro, o que for maior, para grupos de proteção do meio ambiente. Desde então, a empresa já doou mais de US$ 55 milhões a 1.200 organizações.

– Foi uma das primeiras empresas americanas a oferecer aos funcionários licença-maternidade e paternidade. Seus funcionários podem ir trabalhar de bermuda e chinelo e têm horários flexíveis.

– A sede da empresa, em Ventura, na costa da Califórnia, também coloca em ação o que prega. Usam energia solar, só tem comida orgânica no refeitório (onde nenhum item é descartável) e oferece incentivo para o uso de bicicleta.

– Na recepção há um grande quadro com boletins atualizados sobre as condições do tempo para o surfe, esporte preferido de boa parte dos empregados. Ao sinal de boas ondas, qualquer um pode passar a mão na prancha e rumar para a praia.

– A Patagonia foi uma das primeiras empresas americanas a ter creche no local de trabalho.

– Yvon Chouinard adquiriu 17 mil acres de terras no Chile e Argentina, a qual foi anexando novas áreas até um total de mais de 2 milhões de acres na atualidade, sendo o maior proprietário na região patagônica. O objetivo é manter as áreas completamente intactas na forma de Parques Nacionais. Apesar de receber inúmeras ofertas bilionárias de compra, Yvon e sua esposa Malinda, continuam como únicos sócios da empresa e detém controle total, podendo expandi-la em um ritmo saudável e sem pressões de acionistas.

Concluindo

Reconheço que os temas sustentabilidade e consumismo são complexos, e que mesmo uma marca como a Patagonia deixam estragos significativos ao meio ambiente.

No entanto, trazer essa reflexão  e colocar métricas de sustentabilidade na frente do lucro é sem dúvida algo bom para o momento que estamos atravessando.

Apesar de não existir nenhuma loja da Patagonia no Brasil, deixo aqui registrado meu sonho de um dia ver a BHRace patrocinada por essa empresa.

Vai que alguém do departamento de marketing um dia leia isso! 😉

 

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